Vamos tentar fazer uma discussão menos politizada e mais técnica sobre a questão posta na coluna anterior: a suspensão ou não do futebol (e dos esportes, logicamente) devido à calamidade vivenciada no Sul do nosso país.
Primeiro, causa estranheza que se dê tanta publicidade aos pedidos (do governo e atletas, diga-se) de paralisação apenas do futebol. Não se vê o mesmo alarde para outros esportes, nem mesmo se lembram, por exemplo, da proximidade dos Jogos Olímpicos de Paris, que começam daqui a pouco mais de 2 (dois) meses. Ainda que o pedido do Ministério dos Esportes seja apenas de 2 semanas (por enquanto), será que os atletas dos outros esportes, principalmente aqueles em processo de preparação para os jogos, aceitariam essa paralisação? Lembro que, conforme noticiado (https://www.opovo.com.br/esportes/futebol/2024/05/10/ministerio-do-esporte-pedira-suspensao-temporaria-do-brasileirao-por-duas-semanas.html), uma das justificativas seria para se dar maior visibilidade ao momento de calamidade no RS. Aqui, penso que há outras formas de se obter essa visibilidade.
Segundo, será mesmo que duas semanas de suspensão teriam o efeito que se busca? Não parece provável que em apenas duas semanas, considerando que ainda chove no Sul, o momento de calamidade terá terminado. Aqui, digo, me parece que o pedido tem muito mais um viés político do que prático ou técnico.
Terceiro, como ficam os clubes? Permanecerão com suas obrigações de cumprir com a remuneração dos atletas enquanto durar a paralisação? O governo já estudou o impacto disso, principalmente para os atletas dos clubes de menor porte? Certeza é que, não entrando renda dos jogos, os clubes não terão caixa para arcarem com a remuneração. Deixar os atletas das divisões menores sem salários pode ter efeitos tão prejudiciais quanto aqueles vivenciados no RS.
Quarto, na hipótese de paralisação, a empresa detentora dos direitos de transmissão terá alguma indenização? Os torcedores consumidores dos pacotes de televisão e payperview terão algum ressarcimento durante o período sem jogos? No caso de se discutir indenização, o governo já sabe o impacto disso? No fim, como quase sempre ocorre no Brasil, acaba se colocando a responsabilidade em cima dos cofres públicos para cobrir rombos empresariais.
Então, aqui não se pretende diminuir o impacto e a dor sentida pela população gaúcha. O que se pede é discussão técnica, que se verifique as melhores alternativas para ajudar a população do Sul com transparência e boa-fé. Inclusive, por exemplo, com a possibilidade de destinação de renda dos jogos das divisões maiores para um fundo de reconstrução das cidades gaúchas. Há instrumentos legais, como a instituição de empréstimos compulsórios, por exemplo. Não me parece que simplesmente paralisar tudo, com risco de paralisação ou diminuição significativa de atividades econômicas que empregam seja a melhor solução.
Reconhece-se que os clubes gaúchos terão prejuízos esportivos significativos, mas estes clubes podem utilizar instalações esportivas em outros Estados, e a renda dos jogos pode ser destinada ao Sul. A paralisação por questão puramente esportiva não se justifica, já que o prejuízo econômico ao restante do país pode ser mais gravoso ainda.
Vamos pensar, debater, mas não vamos esquecer da transparência e boa-fé. O uso político tem sido uma das maiores mazelas que a triste calamidade vivenciada nos trouxe. Como disse antes, triste.
NA RODADA DA SEMANA DA LIBERTADORES
Falando um pouco de bola no campo, para desanuviar a tristeza, vimos que Galo, Fluminense jogaram da forma correta para conseguir o resultado. O Fluminense se trancou na defesa e foi competente na chance que teve. Galo poderia ter goleado, mas o azar e o goleiro do Rosário não deixaram. Quem viu a falta de longe cobrada pelo Hulk sabe o que estou dizendo. A intensidade de jogo imposta pelo técnico Milito é algo bonito de se ver, torçamos para que o elenco consiga manter o ano inteiro.
O São Paulo deu sustos, mas mostrou o repertório de seu técnico. É o que já estamos dizendo há algum tempo, treinadores de escolas estrangeiras parecem ter muito mais capacidade de pensar fora da caixinha e mudar o que precisa quando o jogo está dando errado. O mesmo vale para o Botafogo, inclusive, que mudou de patamar com o novo técnico português.
Por fim, Flamengo e Palmeiras em polos opostos de análises. Palmeiras voando, como vem sendo há 3 ou 4 anos, mesmo com mudanças de elenco. É de se louvar a base alviverde e reconhecer o olho clínico do técnico Abel Ferreira, que vem achando soluções e lançando jovens promessas com percentual alto de acertos. Já o Flamengo, voltamos ao que já falado também, contratou um técnico cujas características de jogo não combina com o estrelado elenco. Mas vou mais além, o clube rubro-negro precisa ganhar profissionalismo na sua estrutura técnica. É nítido que quando chegam treinadores que cobram isso, a exemplo do Jorge Jesus, o time rende muito acima. Como chegar a isso, não faço ideia, o Flamengo é uma instituição gigantesca, grupos de interesses diversos (como quase todos os clubes que não viraram empresas, diga-se). Talvez só mesmo trazendo treinador estrangeiro, com sua própria comissão, analistas, médicos, para se conseguir obter esse nível de profissionalismo e governança interna que um clube como o Flamengo, com o elenco que tem, precisa.