Dever do Estado e direito e responsabilidade de todos, a segurança pública é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, prega o artigo 144 da Constituição Federal brasileira. Garantir um ambiente de paz, onde o ordenamento jurídico seja respeitado é obrigação dos governos que ocupam a representação estatal, independentemente de cor partidária ou ideologia. Dentre as diversas pautas que a Carta Magna ancora o brasileiro, a que menos é cumprida na sua íntegra é a segurança. O Brasil vive uma guerra diária com números alarmantes de homicídios, roubos, furtos, sequestros e tráfico de entorpecentes.
O “Panorama da Competitividade dos países do G-20 – Brasil 2024″, elaborado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), comprova essa situação caótica que faz o Brasil estar em posições de difícil concorrência entre as economias mais desenvolvidas do mundo. Nos itens “porcentagem da população que se sente segura ao andar à noite na região em que mora” e número de homicídios por cem mil habitantes”, o Brasil é o antepenúltimo na listagem que mediu 25 países, ficando à frente apenas de México e África do Sul. Uma estimativa feita pelo IPEA, em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostra que as perdas do Brasil com a violência chegam a aproximadamente 6% do PIB, um valor próximo ao gasto pelo Estado com a educação.
O fato é que, apesar do gasto exorbitante, o resultado brasileiro no combate à criminalidade é pífio. O país que possui a terceira maior população carcerária do mundo não consegue assegurar o mínimo de ordem para a sua população. As leis frágeis, a demora judicial, um sistema penitenciário dominado por facções criminosas e sem qualquer estrutura para comportar o tamanho da sociedade prisional são alguns dos problemas básicos que o país possui e que não há qualquer estimativa para nos próximos anos solucionar.
O domínio territorial pelas facções criminosas que criaram regramentos próprios em comunidades e controlam serviços básicos que seriam de propriedade estatal, mostra que o Estado não existe em boa parte de seu território soberano. Existem clusters de domínio que usam de força equiparada à do Estado brasileiro em determinadas regiões, configurando em uma perda absoluta de qualquer que seja o poder de domínio das leis brasileiras para aquele ambiente determinado. Falência total. Deixa de ser um problema de segurança pública para um critério de defesa nacional. Nesse ínterim, o Brasil vive uma mexicanização do segmento.
Há quinze dias buscando fugitivos de uma penitenciária de segurança máxima na cidade de Mossoró, frise-se, segurança máxima, o país mostra a deficiência completa no que tange o assunto. Se não fosse trágica, seria cômica a situação. O questionamento que fica é se de fato houve um plano absolutamente perfeito por parte dos criminosos, ou se há algum tipo de facilitação, que mostraria ainda mais uma perversa face da relação entre as fações criminosas com os organismos governamentais. A guerra latino-americana com os narcoestados é uma realidade que cada vez mais se habilita para discussões no Brasil.
Percebendo a fragilidade do governo em dar respostas a esse assunto, a oposição brasileira tem tentado se apoiar na temática para propor alternativas em 2026. O maior exemplo disso é o do governador Ronaldo Caiado, de Goiás, antigo postulante ao Planalto, antes como um exemplar do agro brasileiro, quando se candidatou em 1989, com o apoio da UDR – União Democrática Ruralista, que vem tentando mostrar a eficiência de suas ações na segurança pública em seu estado para alçar voos maiores. Um dado preocupante, mas que não tira apoio popular às suas ações, é que a proporção de mortes decorrentes de intervenções policiais em relação às mortes violentas intencionais dobrou ao final dos quatro anos iniciais de Caiado no governo.
Considerada a resposta fácil, a matança pela matança é o bastião de apoio popular de Nayib Bukele, presidente de El Salvador, que baixou um decreto de estado de emergência no país podendo prender qualquer cidadão sem necessidade de apresentar o motivo para tanto. Sua guerra contra a gangue Mara Salvatrucha tem sido bem sucedida, mas às custas de um pedágio caríssimo, que é a restrição das liberdades civis de alguns inocentes. Esses exemplos extremos reforçam na esquerda brasileira estereótipos de que não se pode endurecer penas e leis, o que faz com que a situação simplesmente não mude. A ideologização leva a caricaturas básicas como se a direita só quisesse sair matando a torto e a direito e a esquerda defendesse os bandidos.
Ministro dos Transportes, Renan Filho poderia estar em outra pasta do governo Lula. Sua gestão em Alagoas foi marcada por alguns avanços, mas nenhum deles comparado ao resultado dado na segurança pública. Alagoas antes de sua assunção ao poder era o Estado mais perigoso do Brasil e, em menos de 8 anos, experimentou a maior redução de violência entre todas as 27 unidades da federação. Alfredo Gaspar, hoje, deputado federal, era o secretário de segurança pública de Renan Filho, que chegou a lançá-lo a prefeito da capital Maceió, tamanho o sucesso da gestão na área.
O exemplo de Alagoas deveria nortear o Brasil. Há espaço para um trabalho eficiente na segurança pública, quando se tem como objetivo mister essa pauta. Com os prejuízos diretos e indiretos que a violência gera ao País, o assunto deveria ser prioridade absoluta do governo federal, que tem 38 ministérios e nenhum dedicado exclusivamente ao tema. Pesquisas recentes do Datafolha, da Atlas e do RealTime Big Data mostraram que o maior problema para os brasileiros é a segurança pública, e é notório, principalmente em grupos de foco qualitativos, o quanto esse clima de insegurança e desordem impactam no ânimo da população e na sua esperança com melhorias.
O caso do fim das saidinhas, amplamente aprovado pela população em geral, é um exemplo de o quanto a ideologização atrapalha respostas na área da segurança. A posição contrária e radical do senador Rogério Carvalho, de Sergipe, chegou a desagradar até mesmo a base governamental, que precisa mostrar reação a essa chaga que domina o Brasil. A segurança pública, antes e mais nada é um dever do Estado, e um serviço público que onera o País e o faz se tornar menos atrativo para investimentos e turismo. O preço da insegurança é muito alto para que seja tratado como uma pauta de costumes. Que Lula olhe para seu próprio time e veja que boas soluções podem sair de dentro de casa.
Por Bruno Soller