Estar no mercado de trabalho nem sempre é uma tarefa fácil e quando se trata de ser uma pessoa com deficiência é ainda mais desafiador. Um exemplo disso foi registrado nesta semana na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de São João da Boa Vista, no interior de São Paulo (SP). Um funcionário, portador de hidrocefalia, foi vítima de agressões verbais.
O auxiliar administrativo Rodolfo Assuani foi ofendido durante uma transmissão ao vivo de um portal policial da cidade. Rodolfo foi chamado de esquisito enquanto trabalhava.
O insulto partiu do repórter responsável pela cobertura, José Urias de Barros Filhos, que mostrava a demora no atendimento na unidade de saúde.
“Me ajuda a cuidar desse povo que tá aqui, Hein, esquisito. ….Esquisitão, viu? Me ajuda a cuidar do povo que ‘tá’ sofrendo desde às 8h. Chama aquele vereador que não faz nada para ajudar o povo aqui”, falou o repórter. “Eu só vou te respeitar porque você é esquisito”, complementou José. Confira o trecho onde os insultos foram registrados:
Sobre o caso, o Instituto Rafael Arcanjo, responsável pelos funcionários da UPA, repudiou a forma como a equipe foi tratada em nota oficial.
“A linguagem e os comportamentos do Sr. Urias durante a transmissão foram não apenas (sic) inadequadas, mas também ofensivas, caracterizando-se por termos pejorativos. Tais ações, além de violarem a dignidade da pessoa humana, são contrárias aos valores que defendemos e à legislação vigente”.
Segundo a instituição, medidas cabíveis já estão sendo tomadas para que atitudes como essas sejam responsabilizadas. Em contato com José, ele informou ao portal Atividade News que não sabia que o funcionário possuía algum tipo de deficiência já que sempre encontrava com o indivíduo em bares da cidade.
José também se retratou publicamente sobre o assunto. “Acabou acontecendo um grave erro meu e, em primeiro lugar, queria pedir desculpas […]. Eu fui atrás de pessoas que conhecem bem esse problema, trabalham no dia a dia com esse problema e eu estou buscando conhecimento para não cometer esse erro de novo”, relatou em um vídeo publicado nas redes sociais.
Em outras postagens, Rodolfo agradeceu pelo apoio perante a ocorrência. Apesar da equipe de reportagem não conseguir o retorno de Rodolfo, casos que reforçam o preconceito contra pessoas com deficiência (pcd) são frequentes.
O palestrante autista Márcio Dias, de 56 anos, que também vive em São João da Boa Vista, contou que estava no estacionamento de um mercado quando um idoso teria se aproximado e tentado tomar a sua vaga, por direito, por “não parecer pcd”.
“Desde quando o senhor é pcd? O senhor está andando, saiu do carro. Cadê a muleta?”, teria sido uma das frases proferidas contra Márcio. De acordo com o palestrante, situações como essa demonstram ignorância no sentido de não ter conhecimento sobre a causa devidamente.
Sobre ocorrências como a de Rodolfo e de Márcio, a psicóloga especialista em atendimentos a pessoas atípicas, Sandra Sousa, explica que doenças, danos emocionais e físicos podem se desenvolver a partir de ofensas.
“O emocional, por incrível que pareça, traz muitas doenças. Tenho casos de pacientes que atendo que as crises são tão exacerbadas por conta de ofensas que trazem danos sensoriais externos que são, tão, tão, delicados, como sintomas de infarto, diarréia, enxaqueca, dores pelo corpo inteiro”, detalhou Sandra.
Além dos efeitos físicos, a especialista salienta que o quadro pode ser agravado ainda mais se a pessoa não conseguir verbalizar o que está sentindo durante aquele momento. No geral, Sandra reforça como a sociedade não está pronta para lidar com nenhuma deficiência ou diferença.